sábado, 31 de março de 2012

O Mundo Da Mentira - Letícia Thompson

Há realidades difíceis de suportar. 
Há situações tão dolorosas e tão irreais, 
embora cruelmente reais, 
que certas pessoas preferem negá-las, 
como se com isso pudessem apagar sua existência. 
E para fugir desses punhais 
que rasgam a alma com tanta violência 
é que muitos preferem se refugiar 
num mundo invisível, 
sob uma redoma de proteção 
que as impedem de ver de perto 
e enfrentar o que tanto faz mal. 
Essas pessoas, ao querer libertar-se de um peso, 
tornam-se escravas da própria dor. 
Sem justificativas, 
justificam-se na recusa da cura, 
que é o encarar a realidade 
e vê-la de maneira nova e diferente. 
Essas pessoas, julgadas doentes, 
loucas e insanas são apenas 
uma pequena porcentagem 
de um mundo onde negar a realidade 
é a coisa mais banal que existe. 
Viver no mundo da mentira não é apenas
ter um comportamento exclusivo 
dos que julgamos loucos. 
Vive na mentira quem 
não aceita o fim de qualquer situação: 
amores que se desgastaram, 
filhos que cresceram, 
uma doença que chegou sem avisar, 
alguém que foi embora, 
escolhas que não aprovamos 
e todas essas pequeninas coisas do dia-a-dia que, 
pequenas, fazem parte da nossa vida.
Chorar e ficar calado num canto 
não muda nada do que vivemos, 
a não ser nos deixar à parte da vida 
que continua a correr do lado de fora. 
Fazer-se de cego e surdo não modifica 
a realidade do que não podemos controlar, 
nem o que os outros pensam e sentem.
Poderemos evitar os espelhos por algum tempo, 
mas não os evitaremos a vida toda. 
Melhor que ignorar a realidade que nos machuca 
é pegar o que sobra dela 
e construir um novo mundo 
ou uma nova maneira de viver. 
Se a chuva nos pega de surpresa, 
que então nos molhe completamente, 
que o sol nos seque, 
que o frio não nos impeça de sair de casa, 
que o calor não nos impeça de dormir, 
que a dor doa e parta e que a vida seja inteira, 
completa e real!

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