segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Vinícius de Moraes

Eu deixarei que morra
em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa 
de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa 
como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto 
e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser 
tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim 
como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho 
nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne 
como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás 
a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos 
e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, 
porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite 
e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa 
suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência 
do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros 
nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém 
porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, 
do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, 
a tua voz serenizada.

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